sábado, 11 de setembro de 2010

A nova arte do século 21

Ars Electronica, o maior e mais antigo festival de arte midiática do mundo, conta com instalação interativa do artista multimídia goianiense Hugo Camargo 






Maior e mais antigo festival de arte midiática (também conhecida como new media art ou electronic art) do mundo, o Ars Electronica Festival chega este ano à sua 31ª edição com o tema "Repair – Ready to pull the lifeline", ou em bom português, "Reparo - Pronto para puxar a linha da vida", que acontece de 3 a 11 de setembro na cidade de Linz, na Áustria. Apostando na arte sustentável como alternativa ao mundo industrial pós-moderno no qual vivemos, esse ano o evento está sendo realizado pela primeira vez em uma antiga fábrica de tabaco, a Tabakfabrik, um espaço de proporções generosas que guarda em suas características arquitetônicas traços marcantes da industrialização.

Dentre os expositores, encontra-se o artista goianiense Hugo Camargo, 28, que atualmente mora em Viena, na Àustria, onde participa do programa internacional de mestrado "Interface Cultures" (Culturas da Interface), oferecido pela Universität für künstlerische und industrielle Gestaltung Linz (Universidade de Artes e Design Industrial de Linz). Antes disso, Hugo viveu quatro anos em Florença, na Itália, onde se graduou, no ano passado, em "Discipline dello Spettacolo in Arti Visive" (Disciplinas das Artes Visuais e do Espetáculo) pela Libera Accademia di Belle Arti di Firenze (Libera Academia de Belas Artes de Florença).

"Sou um artista multimídia, trabalho com arte eletrônica, arte feita com computador - ou não, mas sempre algo relacionado à condição homem/computador/meio. Recentemente, comecei a me aventurar também no campo da curadoria e da preservação de arte realizada com novas mídias (new media art). Minha pesquisa artística se concentra principalmente nos terrenos da arqueologia midiática e instalações interativas", explica o artista.

Na Ars Electronica 2010, Hugo integra a exibição "Playful Interface Cultures" (algo como Jogando/Brincando com a Cultura de Interface), com curadoria do experiente pesquisador Georg Russegger, diretor do mestrado "Ludic Interfaces" (Interfaces Lúdicas) da Universidade de Artes e Design Industrial de Linz. Segundo Hugo, o termo "playful", que também significa lúdico, sugere como ver as coisas por uma perspectiva diferente, e não necessariamente a ideia de jogo que a tradução literal nos proporciona. "Um novo olhar, mais impregnado de ludicidade nas relações homem/máquina/sociedade é o foco maior da exibição", explica.

Arte através de um telefone celular

A obra assinada por Hugo, realizada com a colaboração da artista austríaca Veronika Pauser, foi batizada de "Mohr SMS", e consiste numa instalação interativa onde a tela de um telefone celular é usada como tela de um quadro para produzir arte generativa. Com raízes na arte conceitual, a arte generativa trabalha a construção de um objeto/sistema apoiado em mecanismos parcialmente exteriores ao artista que, com alguma autonomia, geram trabalhos segundo regras instauradas pelo autor. Ou seja, o artista cede a função de exercer a construção do objeto e decide-se por uma passagem para um meta-nível onde cria um conjunto de instruções.

A instalação em questão se resume a um telefone celular conectado a uma tela de LCD emoldurada e um sinal onde se fornece o número do telefone. Dessa forma, "Mohr SMS" permite que as pessoas adicionem elementos gráficos em tempo real através de mensagens de texto, que assim que enviadas são decodificadas através de algoritmos que as traduzem em traços que percorrem seus caminhos dentro da tela até formar um emaranhado de linhas de diferentes tamanhos e espessuras.

O resultado, embora possa parecer, nunca é randômico: cada mensagem corresponde a um determinado algoritmo, onde características como a utilização de espacos, tamanho das palavras e utilização de pontuação determinam o resultado visual de cada mensagem de texto.

A mesma mensagem gera sempre o mesmo algoritmo e, consequentemente, a mesma imagem na tela. A cada 10 mensagens, a tela volta ao seu estado inicial, permitindo que outra imagem possa ser construída. As obras anteriores são armazenadas para posteriormente serem disponibilizadas no website oficial da instalação (www.mohrsms.com).

A arte generativa de Manfred Mohr
 
Hugo explica que o algoritmo é baseado na obra de Manfred Mohr, artista alemão que foi um dos pioneiros da arte generativa no mundo. "Esteticamente, Mohr SMS presta homenagem a obra "P18" de Manfred Mohr, de 1969. Manfred Mohr escreveu algoritmos que, uma vez no computador, produziam imagens sem nenhuma intervenção humana, dando à máquina uma autonomia nunca antes vista no mundo da arte. Mohr SMS repropõe a arte generativa adicionando o fator interatividade. De uma forma simples, onde se pode participar com qualquer tipo de telefone celular (independente da tecnologia de cada celular), o espectador é parte essencial da obra, que consiste principalmente no algoritmo aliado à interação. Uma espécie de pintura virtual coletiva onde a obra não é completa sem a interação do espectador", explica o brasileiro.

Isso porque, sem mensagens de texto enviadas, a tela permanece branca, como um quadro a se fazer. Daí o nome da obra, uma alusão ao pioneiro da arte generativa, Manfred Mohr, e também um trocadilho com o fato de que, para existir, a obra de arte precisa da interação do espectador, precisa de mais mensagens de texto ("more sms").

Obra premiada


A obra tem tido uma ótima recepção durante o Ars Electronica 2010, tendo recebido o 2º lugar do Prêmio da Crítica dentro da exibição Playful Interface Cultures. Além disso, Hugo acaba de ser selecionado para um festival em Istambul, na Turquia, em novembro, e já está negociando exposições pela Europa e Estados Unidos.

Até agora, o artista goianiense já teve seus trabalhos expostos no "Athens Video Art Festival 2007", em Atenas, na Grécia; "Networking Eyes 2007", em Florença, na Itália;  "NewMediaFest [Slowtime 2007 - Quicktime as an artistic medium]" que foi exposto virtualmente no website do festival e fisicamente em diversos países, como Alemanha, Portugal, Argentina, Sérvia, Índia e Espanha; "Rassegna Giovani Artisti 2008", exibição na qual participaram apenas trabalhos de artistas localizados na região Toscana italiana (Capraia, Itália); e "Tools for Revolution or Just for Sale" (Ferramentas para Revolução ou Apenas Para a Venda) em 2009, também em Florença, na Itália.

Indagado sobre a vontade de expôr no Brasil, Hugo afirma achar até curioso o fato de já haver exposto em tantos lugares do mundo em tão pouco tempo e ainda não ter rolado no Brasil, mas revela que possui planos de trazer sua arte para a terra pátria. "Estou planejando uma mostra para Goiânia como curador, e terá um trabalho meu nela. Talvez o fato de eu morar fora tenha me distanciado um pouco da cena local, já que perdi os contatos com curadores e artistas de Goiânia. Porém, penso que promover algo no campo de artes com novas mídias pode abrir caminhos não só para mim, mas para vários outros artistas locais com uma produção que foge um pouco da arte convencional já feita na cidade", adianta.

Para conhecer mais sobre o artista, acesse www.hugocamargo.com.

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