sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Cultura popular e realismo fantástico

Em As Centenárias, premiado espetáculo que chega amanhã a Goiânia, Andréa Beltrão e Marieta Severo vivem Socorro e Zaninha, carpideiras do interior nordestino que se aventuram a enganar a morte


Escrita especialmente para as atrizes Marieta Severo e Andréa Beltrão pelo talentoso dramaturgo Newton Moreno, o espetáculo As Centenárias desembarca amanhã em Goiânia para duas apresentações, às 20 horas e às 22h30, no Teatro Rio Vermelho. Dirigida por Aderbal Freire-Filho, a peça foi uma das grandes vencedoras do Prêmio Shell de Teatro, rendendo a Newton e à dupla Fernando Mello da Costa e Rostand Albuquerque os troféus de melhor autor e melhor cenário, respectivamente, além de consagrar Andréa Beltrão como melhor atriz. Além disso, o espetáculo ainda levou os prêmios Contigo de melhor atriz (Andréa Beltrão), melhor espetáculo de comédia (júri oficial e voto popular) e melhor autor (Newton Moreno); Prêmio Qualidade Brasil de melhor espetáculo de comédia, melhor atriz de comédia (Marieta Severo) e melhor diretor de comédia (Aderbal Freire-Filho); e Associação dos Produtores de Teatro do Rio de Janeiro (APTR) de melhor atriz (Andréa Beltrão).

Transformadas em Socorro e Zaninha, carpideiras do interior nordestino que se aventuram a enganar a morte, as atrizes dividem o palco com o ator Sávio Moll, que anima os 240 bonecos mamulengos confeccionados especialmente para o espetáculo. A ação é toda passada em torno de um caixão, ponto central do cenário criado pelos cenógrafos Fernando Mello da Costa e Rostand Albuquerque. “Encomendamos 60 mamulengos ao Mestre Tonho, de Olinda. Os outros 180 foram criados pela professora em arte de bonecos Ivete Dibo, que ainda fez máscaras para compor o cenário”, detalha Fernando.

Segundo Marieta, a trama se desenvolve embalada por personagens e ‘causos’ que muitas vezes beiram o fantástico e o irreal. “É interessante ver como o maravilhoso, o surreal, está inserido no cotidiano dessa gente. São personagens que enfrentam uma vida hostil, cheia de reveses, mas ainda assim seguem em frente com humor, imaginação e crença no fantástico”, explica a atriz.

Com uma amizade que já dura mais de 20 anos, Marieta e Andréa costumam brincar que já se conhecem há mais de um século, daí o nome do espetáculo. A trilha sonora, composta especialmente para a peça, leva a assinatura de Tato Taborda, e o figurino ficou por conta de Samuel Abrantes. Em entrevista exclusiva, Andréa Beltrão falou das parcerias com a amiga, entre elas o Teatro Poeira, a preparação para a peça e os planos para o próximo semestre. Confira:

Vocês se conhecem há mais de 20 anos e fazem um bom par tanto em cima dos palcos quanto fora deles. Tanto que vocês possuem uma parceria que é o Teatro Poeira, fundado em 2005 em Botafogo, Zona Sul do Rio. Dá para acompanhar de perto as outras produções que rolam por lá? Como é a relação de vocês com o espaço?


Andréa Beltrão - Temos o maior interesse na produção cultural do Rio de Janeiro, do Brasil e do mundo. No Poeira, desenvolvemos um projeto extenso criado pelo nosso curador Aderbal Freire Filho e tentamos fazer um verdadeiro intercâmbio através das oficinas que organizamos ao longo do ano. Muitas vezes não conseguimos assistir nem aos próprios espetáculos que trazemos para o Poeira, como foi o caso de Gatomaquia, do grupo uruguaio La Cuarta, dirigido por Hector Manuel Vidal, que esteve no Poeira justamente enquanto nos apresentávamos em Brasília.

Como surgiu a ideia de levar esta cumplicidade para cima do palco através de As Centenárias? Qual foi o estalo inicial que fez a fagulha virar este verdadeiro fogaréu de prêmios e reconhecimento da mídia e do público?


Andréa Beltrão - Nós tínhamos acabado de fazer um drama profundo, lindo, denso, Sonata de Outono, de Ingmar Bergman, e estávamos com vontade de mudar de universo. Em Sonata, interpretávamos mãe e filha que tinham uma relação muito complicada, de amor e ódio. Então nosso único pedido foi não fazer nada que falasse de família. O Newton teve essa ótima idéia, escreveu um belo texto, engraçado, e junto com a mão de ouro do Aderbal, a fagulha virou uma festa.

E a parceria com Newton Moreno, como veio? Já haviam trabalhado juntos antes?


Andréa Beltrão - Essa é a primeira vez que trabalhamos juntos, mas tivemos muita afinidade, foi um trabalho exaustivo, mas fácil e feliz.

Vocês duas já haviam explorado, em outros trabalhos, a temática nordestina. O que mais atrai vocês na cultura desta região? Qual é a característica mais forte do povo nordestino que acaba sendo a alma das personagens?


Andréa Beltrão - Como artistas, temos curiosidade por toda e qualquer cultura. Na pesquisa que fizemos para As Centenárias, nos divertimos muito com os ditados, a sabedoria popular, as preces, os costumes e uma alegria enorme de viver, apesar das dificuldades.

Como foi o estudo para a construção das carpideiras? Quanto tempo levou a preparação? Vocês visitaram a região do Cariri para se basear no momento de criação das personagens?


Andréa Beltrão - Ensaiamos durante três meses. Fizemos aulas de canto de carpideiras e manipulação de bonecos, além de muita aeróbica para aguentar correr, cantar e pular sem parar por uma hora e meia de peça. Isso sem falar em todos os livros (maravilhosos!) que o Aderbal recomendou que a gente lesse... Não fomos ao Cariri pessoalmente, mas viajamos para lá todos os dias que estamos em cena com a peça.

Os mamulengos são uma representação figurativa muito tradicional e também particular da cultura popular nordestina. Como se deu a escolha de Sávio Moll para dar vida aos bonecos? Ele já possuia ligação com a arte?


Andréa Beltrão - O Sávio é um experiente ator e ótimo palhaço, que é uma coisa dificílima. E ele já tinha experiência com bonecos. Para nós, foi o parceiro ideal.

Quais são os planos para os próximos meses? Por onde a peça ainda passará?


Andréa Beltrão -
Depois de Goiânia vamos para Curitiba (PR), Belo Horizonte (MG), Porto Alegre (RS) e Florianópolis (SC). Encerramos a primeira parte da turnê e voltamos a viajar em 2011. Na verdade, temos mais um plano juntas: ontem, começamos a construção do anexo do Poeira, o Poeirinha. Teremos um teatro de 60 lugares, uma sala de ensaio, uma sala para aulas de dança, escritório, uma lanchonete, exposições, oficinas... Essa é a nossa mais nova aventura.

SERVIÇO
Espetáculo As Centenárias - Com Andréa Beltrão e Marieta Severo
Quando: Amanhã, com sessões às 20 horas e às 22h30
Onde: Teatro Rio Vermelho (Centro de Convenções de Goiânia)
Ingressos: R$ 80 (inteira) e R$ 40 (meia entrada)
Pontos de venda: Zastras Brinquedos e Bilheteria do Teatro
Informações: (62) 3582-0009/3219-3400