terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Resenha de “Fatores de Identificação em Projetos de Mobilização Social”, de Clara Soares Braga, Daniela Brandão do Couto e Silva e Rennan Lanna Martins Mafra


A teoria das Relações Públicas, que durante muito tempo baseou-se no funcionalismo como algo fortemente vinculado ao desenvolvimento do capitalismo, encontrou após os anos 80 uma demanda por um trabalho mais comprometido com os interesses dos diversos segmentos sociais. César (1998) propõe o engajamento do profissional de comunicação na dinâmica social e na reformulação do aporte teórico que orienta seu trabalho, no intuito de acompanhar as exigências e transformações ocorridas na sociedade civil nas últimas décadas.

A atuação do profissional de Relações Públicas se configura como uma valiosa contribuição para as instituições e para os movimentos sociais, podendo minimizar situações de crise e potencializar os resultados positivos, possibilitando aproximação e criação de vínculos com os diversos públicos. Diferentemente de uma empresa, todo projeto de mobilização social necessita de um planejamento de comunicação capaz de promover uma vinculação com membros atuantes e potenciais, alimentando o grupo de informações que mantém o grupo coeso, ou seja, o público deve ser incorporado de tal forma que se torne o próprio grupo gerador do projeto.

Os movimentos sociais ficaram mais evidentes somente a partir do século XX, com o advento das novas mídias, que alterou a maneira como se apresentam através de novas possibilidades de transmissão de informações, imagens e conhecimentos, transformando sua dinâmica de mobilização. Segundo Castelis (1999), os meios de comunicação passaram a exercer a função de infra-estrutura organizacional dos movimentos, agrupando e dando força às ações promovidas por eles.

Os movimentos sociais são ações coletivas orientadas para a mudança. Para Toro & Werneck (1996), a capacidade dos indivíduos de promover mudanças vem da incorporação dos sentimentos de democracia, cidadania, produtividade e entendimento sobre o que é público.  A democracia pode ser considerada uma ordem social “autofundada”, uma vez que as mesmas pessoas que criam as regras também as comprem e protegem. Dessa maneira, os males da sociedade são resultado de uma ordem social que nós mesmos criamos, e aceitar essa responsabilidade pela realidade traz a obrigação de transformá-la. O cidadão é aquele que, juntamente com outros, é capaz de promover transformações e mudanças.

O conceito de produtividade, por sua vez, não se refere à produção de dinheiro, mas sim de riqueza, possibilitando uma vida digna para todos. Já o público não é aquilo que vem do governo, mas o que, através de deliberação e de acordo, convém a todos.

As características mais fundamentais dos movimentos sociais, segundo o texto, são o compartilhamento de um sistema de valores, identidade, normas e estrutura organizacional comuns. Segundo Sherer-Warren (1999), os movimentos sociais se dividem em três grupos: os contestadores, que denunciam, protestam e explicitam conflitos; os solidarísticos, que buscam parcerias para a resolução de problemas sociais; e propositivos, que anseiam pela construção de uma utopia de transformação e mudança. Porém, muitos movimentos são híbridos, podendo possuir ao mesmo tempo as três dimensões.

Castellis (1999) define três princípios básicos para a os movimentos sociais: identidade (é como o movimento se autodefine em relação a sua ideologia, práticas, valores, etc); adversário (é a identidade pela afirmação da diferença); e meta societal (consiste na visão do movimento sobre o tipo de ordem que se almeja alcançar).

Utilizando o conceito de Toro & Werneck (1996), compreende-se mobilização como um processo de convocação de vontades para uma mudança de realidade, através de um consenso de propósitos. O maior desafio da comunicação em projetos de mobilização social se refere à criação de um processo participativo, gerando e mantendo canais desobstruídos para que os públicos interajam entre si e com o projeto. Cabem iniciativas descentralizadoras, de caráter dialógico, libertador, educativo e de coordenação de ações.

Os públicos dos processos de mobilização se dividem em três grandes grupos: beneficiados, legitimadores e geradores. Os beneficiados são aqueles que consciente ou inconscientemente são beneficiados de alguma maneira. Já os legitimadores são os que tornam o projeto legítimo, reconhecendo publicamente sua autenticidade. O que transforma um público beneficiado em legitimador é exatamente a formação de um julgamento, de um juízo positivo sobre o projeto. Os geradores, por sua vez, são os públicos que realizam qualquer ação que contribua para os objetivos traçados pelo projeto, sejam eles gerais ou específicos.

A vinculação ideal aspirada por todo e qualquer projeto de mobilização social diz respeito a um aumento no nível de co-participação, que existe quando o público gerador tem sua ação pautada pelo sentimento de responsabilidade sobre o projeto, seu sucesso ou fracasso. Isso equivale a dizer que a ação comunicativa tem como objetivo fazer crescer o público gerador e a participação deste, sempre orientada pelo sentimento de co-responsabilidade.

As estratégias de mobilização almejam a criação e fortalecimento destes vínculos, tendo como pré-requisito a coesão e continuidade dos projetos, gerando um processo contínuo de participação. Dentre os públicos geradores destacam-se os produtores, reeditores e editores. Os produtores são os propositores do projeto, que primeiro vislumbram sua relevância e formulam os objetivos e os meios de alcançá-los. Os reeditores são as pessoas que possuem público próprio, modificando, introduzindo ou eliminando mensagens dentro de seu grupo. Devem promover ações locais, ao alcance das pessoas, mas que se refiram aos valores gerais. Os valores devem transcender a causa, dando-lhe legitimidade. Já os editores transformam o conteúdo proposto em mensagens adequadas a cada grupo de reeditores, assegurando o permanente fluxo de informação entre eles.

O que distingue a coletivização da simples divulgação é exatamente seu compromisso com os resultados. Os modelos de comunicação que podem ser usados no processo mobilizador são a comunicação de massa, a comunicação macrointencional (segmentada) e a comunicação dirigida.   A comunicação de massa serve para dar legitimidade à causa, aumentando sua força de convocação e dando visibilidade aos resultados.

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